A ciência denominada nutrigenômica estuda a interação gene-nutriente, ou seja, o funcionamento das informações do DNA de cada um, e como as pequenas variações existentes entre os indivíduos influenciam o modo como cada pessoa responde à dieta. O objetivo é entender que tipo de alimentação seria mais apropriada para a prevenção de doenças e uma vida plena. A esperança é que no futuro possamos individualizar, ao máximo, a dieta prescrita.
São várias as aplicações futuras deste conhecimento. Entenderemos, por exemplo, o motivo pelo qual algumas pessoas emagrecem facilmente e outras não, o porquê de alguns indivíduos perderem peso diminuindo levemente as porções e outros só emagrecerem ao fazerem mudanças radicais na alimentação.
Várias outras questões intrigam ainda a ciência: por que algumas pessoas possuem colesterol alto, mesmo sendo vegetarianas, enquanto outras fritam os alimentos com banha de porco e ainda assim têm ótimos valores de gorduras plasmáticas? Que tipo de perfil genético faz com que alguns indivíduos sejam extremamente sensíveis ao sódio, enquanto outros conseguem manter a pressão arterial em níveis perfeitamente normais, mesmo consumindo quantidades imensas de sal? Será que você é um corredor que necessita de altas quantidades de carboidratos para um rendimento ótimo ou, ao contrário, quantidades mínimas fazem seu corpo se comportar melhor?
Espera-se que a nutrigenômica responda a essas questões. O mapeamento genético personalizará o diagnóstico, a prescrição e qualquer tratamento de acordo com a singularidade biológica, mas até lá precisaremos nos valer dos conhecimentos já existentes da ciência da nutrição a fim de planejar os cardápios dos corredores. A individualização atual requer também uma auto-observação. É preciso que cada um saiba como o próprio corpo funciona, que sintomas aparecem após o consumo de determinados alimentos e qual o benefício do consumo de tantos outros.
Uma coisa é clara em nossa sociedade: consumimos carboidratos demais, açúcar demais, alimentos industrializados demais. No Brasil, a cada nova pesquisa de orçamentos familiares divulgada pelo IBGE, a situação se agrava e fica mais clara: quanto mais o brasileiro gasta com refrigerantes, doces, biscoitos e bolos, mais gordo fica. E isso vale para todos: idosos, adultos, adolescentes e crianças de qualquer classe social.
PERDE E GANHA - A solução para emagrecer? Passar longe destes alimentos. Funciona? Para quase todo mundo. A maior parte das pessoas consegue perder peso quando restringe as calorias e gasta energia por meio da atividade física. O problema é que a maioria reganha o peso perdido. Para estes ou para os que não conseguem atingir o peso ideal ou os níveis de saúde desejáveis, mesmo passando longe dos alimentos citados acima, outras estratégias devem ser testadas.
Lembre que os carboidratos não estão presentes apenas nas guloseimas, mas também em pães, no arroz, nas frutas e verduras e que, ao chegarem à corrente sanguínea na forma de glicose, estimulam a liberação do hormônio insulina, o qual possui propriedades anabólicas, estimulando o estoque de nutrientes e gordura. Este processo fundamental ao bom funcionamento do corpo pode ser exagerado em alguns, levando ao ganho de peso desnecessário. Isso pode ocorrer mesmo em atletas, os quais passam a vida lutando contra a balança.
Com o objetivo de corrigir o problema, dietas com baixos teores de carboidratos são advogadas por muitos estudiosos da área. As mesmas restringem os carboidratos simples, presentes no açúcar, pão, macarrão, farofa, tapioca e na maior parte dos alimentos industrializados. Também limitam o consumo de frutas e verduras com alto índice glicêmico, como batatas, banana, mamão, abacaxi, melancia, beterraba e cenoura. Em contrapartida, liberam carnes magras, ovos, queijos magros, laticínios desnatados, nozes e castanhas. Como você sabe, as proteínas são necessárias para crescimento, manutenção e reparo da musculatura. Mas atenção, corredores: dietas paupérrimas em carboidratos levam a uma utilização desta proteína muscular, podendo aumentar o risco de lesões.
VEGETAIS FOLHOSOS E FRUTAS - Por isso, pesquisadores que trabalham com desportistas pregam dietas com quantidades reduzidas de carboidratos, mas que contenham um abundante suprimento de vegetais folhosos e frutas que levem à menor liberação pancreática de insulina, como morangos, laranja, maçã, limão, maracujá, melão, kiwi, amora, mirtilo e pera.
O objetivo destas dietas é promover a queima de gordura e levar à cetose, fato que comprovadamente reduz o apetite, acelera a perda de peso e a redução dos níveis plasmáticos de colesterol. Por outro lado, enquanto para alguns uma dieta com restrição de carboidratos funciona bem, para a maioria dos atletas o cansaço excessivo pode aparecer, assim como dores de cabeça e tontura. O cheiro característico de cetonas na urina, suor e hálito também é evidente.
Os corpos cetônicos são fragmentos de carbonos gerados com a queima parcial das gorduras dos estoques. Com o tempo o cérebro e outros tecidos tornam-se eficientes no uso dos corpos cetônicos. Por isso, em geral, estes sintomas são resolvidos após um período de adaptação no qual não se observam quedas do rendimento físico em exercícios de longa duração. Já em exercícios anaeróbicos, que demandam altas quantidades de glicogênio, como corridas curtas e rápidas e musculação de alta intensidade, o rendimento pode cair sim.
Outro efeito indesejável é o enfraquecimento dos ossos. Este perigoso efeito adverso ocorre sempre que há uma metabolização excessiva de proteínas, levando a uma produção excessiva de amônia, a qual acidifica o sangue e gera uma excreção exagerada de cálcio pela urina. Já quando carboidratos simples são cortados, mas o consumo de frutas e verduras é aumentado, estes problemas não acontecem. A acidose também seria a responsável por outras doenças, como o aparecimento de pedras nos rins e o próprio aumento do risco de câncer pela deficiência de vitaminas, minerais, antioxidantes, fibras e fitoquímicos.
EFEITOS NEGATIVOS - Esta questão é importantíssima já que, apesar dos possíveis benefícios de qualquer dieta cetogênica (redução da fome, diminuição dos estoques de gordura, equilíbrio do perfil lipídico), estudos mostraram que as taxas de mortalidade não foram reduzidas com dietas ricas em proteínas e pobres em carboidratos. Uma das hipóteses é que estas dietas carecem de substâncias que protejam os telômeros, estruturas responsáveis pela integridade dos cromossomos.
Cada vez que uma célula do nosso corpo se divide, os telômeros são encurtados e a célula perde sua capacidade de regeneração. Este encurtamento é acelerado por fatores ambientais, tais quais estresse, consumo exagerado de bebidas alcoólicas, tabagismo, ingestão aumentada de calorias. Por outro lado, os telômeros são protegidos por substâncias provenientes da alimentação como o ômega-3, a vitamina C, a vitamina D e o selênio.
Dessa forma, caso resolva testar uma dieta com menores teores de carboidratos, a recomendação é que exclua pães, macarrão, pizza, arroz, a maior parte dos tubérculos e alimentos industrializados, mas mantenha frutas e verduras de baixo índice glicêmico, a fim de maximizar o consumo de vitaminas, minerais e fitoquímicos protetores (veja box).
Tome cuidado com dietas muito restritivas, pois, em geral, em algum ponto as mesmas conduzem à monotonia alimentar e à frustração, gerando o abandono e a compulsão pelos alimentos que foram por tanto tempo excluídos do cardápio.
Lembre-se de que o corpo dos corredores não se comporta de maneira idêntica. Enquanto alguns são extremamente sensíveis aos carboidratos, engordando ou inchando demais sempre que aumentam o consumo deste nutriente, outros não terão este tipo de problema e, ao contrário, se sentirão muito melhor dispostos adotando uma dieta hiperglicídica. O importante é observar seu organismo até que a nutrigenômica possa oferecer as respostas que tanto buscamos.
COMO REDUZIR O CARBOIDRATO
Para diminuir o carboidrato sem diminuir o consumo de nutrientes importantes e de quebra emagrecer, ter proteção contra doenças crônicas e ter energia para a atividade física, siga as orientações abaixo:
• Varie suas fontes de proteína. Prefira proteínas magras. Reduza o consumo de carnes vermelhas para duas vezes por semana, elimine o consumo de carnes processadas, como presunto, salsicha, linguiça, bacon e salame. Aumente o consumo de peixes e ovos.
• Incorpore proteínas de origem vegetal ao seu cardápio. O grupo das leguminosas (feijão, lentilha, ervilha, grão de bico, soja) fornece proteína, ferro, fibras. Castanhas, nozes e sementes também são boas fontes de proteínas.
• Aumente o consumo de alimentos ricos em fibras, potássio e fitoquímicos e com baixo índice glicêmico, como brócolis, repolho, couve-flor, couve, agrião, alface, tomates, pepino, brotos, cogumelos, batata-doce, morangos, melão, maçã com casca, cereja fresca, laranja, kiwi, pera com casca, ameixa fresca, pêssego, chia, aveia, quinoa, linhaça, tahini.
• Dê um tempo para o seu corpo se adaptar ao estilo de vida com menos carboidratos. Por isso não comece a dieta antes de uma competição importante ou desgastante.
• Hidrate-se adequadamente. Dietas com baixos teores de carboidratos tendem a levar a uma desidratação leve, já que cada grama de glicogênio (carboidrato de reserva) é estocado com 2,7 gramas de água. Dessa forma, queimando-se o glicogênio, a água que estava estocada é eliminada. Consuma durante o dia água, chás, refrescos de limão, maracujá ou acerola sem açúcar ou adoçados com estévia ou agave.
• Depois dos treinos tome um copo de leite com cacau e canela ou um iogurte batido com morango ou mirtilo para repor carboidratos e proteínas. Outra opção é adotar o omelete com salada de folhas verdes (acelga, agrião, almeirão, chicória, couve, brócolis, espinafre, repolho, taioba), tomate, pepino, maxixe, nabo, palmito, rabanete. Para aumentar ainda mais o consumo proteico, acrescente à sua salada cogumelos ou castanhas.
CARDÁPIO ENXUTO
Para finalizar, vamos derrubar um mito. Muitas pessoas acreditam que se começarem uma dieta com menos carboidratos morrerão de fome, mas isso não é verdade. Uma dieta saudável para mulheres adultas ativas deve fornecer, em média, 2.000 kcal e para homens, 2.500 kcal. Um cardápio com proteínas magras e carboidratos de baixo índice glicêmico consegue atender facilmente a esta necessidade fornecendo todos os nutrientes protetores requeridos ao organismo.