ophoda, já que você tentou trazer, embora de forma bastante imprecisa, a discussão para um corner mais técnico, eu vou ser um pouco tecnicista nas resposta a você, ok?
vamos por partes:
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"Sobre o ponto 1, não existe uma lei da causalidade em ciência, sendo esse conceito usado apenas em questões onde o tempo é escalar, onde se pode definir um t0 e um t1 e uma relação entre eventos que ocorre nesse intervalo de tempo. Isso é possível na mecânica clássica e na relatividade, considerando um referencial inercial, mas não na mecânica quântica, onde os eventos são nuvens de probabilidade (pelo Princípio da Incerteza de Heisenberg) e não aparentemente determinísticos como nas outras duas áreas citadas. Não existe casualidade na aparição e aniquilação de matéria e antimatéria no vácuo, nem no decaimento radioativo espontâneo."
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você está equivocado, causalidade é um requisito básico em qualquer teoria física, e isso tanto no domínio clássico quanto no domínio quântico. eu vou citar 2 referências básicas para você (se quiser que te diga os capítulos específicos para estudar, eu posso te dizer):
1. os 3 volumes de teoria quântica de campos do weimberg;
2. o livro de teoria quântica de campos do peskin (livro padrão usado em todas as pós-graduações em física ao redor do mundo).
em primeiro lugar, o tempo não é um escalar na relatividade. vamos definir inicialmente o que é um escalar em física: um escalar é um singleto ou invariante sob um dado grupo de simetria. no caso da física newtoniana, o grupo de simetrias relevante é o grupo de galileu, sob o qual o tempo é realmente um escalar. no caso da relatividade, cujo grupo de simetria relevante é o grupo de lorentz, o tempo não é um escalar, pois é uma das componentes do 4-vetor posição, ou seja, não é invariante sobre boosts, mudando de um referencial boostado para outro de acordo com as transformações de lorentz.
em segundo lugar, um equívoco comum entre leigos é achar que a mecânica quântica é não-determinística de um modo geral. isso é falso. a diferença básica com relação à física clássica é que, pensando no caso mais simples de formalismo de primeira quantização (note que não é apenas isso que é usado para se descrever teorias quânticas de campos, como a QED e a QCD!), quando você promove as variáveis do espaço de fase hamiltoniano clássico, (p,x), a operadores atuando sobre funções de onda definidas em um espaço de hilbert de estados físicos, as variáveis (p,x) que eram determinadas classicamente resolvendo-se o princípio de mínima ação, são agora operadores que atuam de forma extremamente bem definida, de acordo com equações determinísticas, sobre funções de onda. por exemplo, no caso mais simples não relativístico, você resolve a eq. de schrödinger com um dado potencial que codifica a física do sistema considerado (oscilador harmônico, átomo de hidrogênio, átomo de hélio, etc). a eq. diferencial a ser resolvida é totalmente determinística e corresponde a uma lei da natureza (no caso aqui considerado, descrita pela eq. de schrödinger com um dado potencial). a solução desta eq. te dá um conjunto de autovetores do operador diferencial considerado (as funções de onda) e um conjunto de autovalores (o espectro de energia). A única coisa não-determinística aí é o fato de que a função de onda corresponde a uma densidade de probabilidade que te indica possíveis estados físicos do sistema com diferentes pesos estatísticos. A eq. diferencial é determinística (e corresponde a uma lei da natureza), e sua solução indica o que pode ou não ocorrer no sistema (por exemplo, você nunca vai ver o átomo de hidrogênio emitindo raias fora do espectro de autovalores permitido pela eq. de schrödinger!) com um dado peso estatístico.
Note que nada disso viola causalidade em teorias que são fisicamente consistentes. de fato, em qualquer livro de teoria quântica de campos (lembre que o modelo padrão, formado pelo setor eletrofraco e pela QCD é uma teoria quântica de campos causal!), você aprende logo no início do curso que uma teoria consistente deve ser causal, ou seja, um dado evento P só pode ser afetado por eventos dentro do seu cone de luz passado e só pode afetar eventos dentro do seu cone de luz futuro. Isso é implementado matematicamente via relações de comutação a tempos iguais. Se uma teoria quântica de campos viola causalidade, você pode jogá-la no lixo, pois ela não tem capacidade preditiva alguma.
Inclusive, um ponto extremamente simples de se checar usando computação numérica é tentar implementar em um computador eqs. diferenciais não-causais: você vai ver que o computador não consegue resolvê-las, pois o problema de cauchy envolvido é mal definido! De fato, a maior parte dos sistemas físicos realísticos não tem solução analítica, apenas numérica, e não é possível implementar absolutamente nada não-causal em um computador!
Com relação a não haver causalidade nas flutuações do vácuo, você está equivocado novamente, ou no mínimo usando uma semântica bastante duvidosa. Vou novamente ilustrar este ponto, mas agora te dando um pouco mais de trabalho, te propondo um exercício simples (se você abrir qualquer livro de teoria quântica de campos você resolve): quais são os possíveis spins de partículas que você consegue excitar a partir do vácuo do modelo padrão?! Qual a razão de serem estes valores de spin, e não uma estatística aniônica, por exemplo (a qual é possível de ser realizada em sistemas de dimensão menor em matéria condensada)?!
Não confunda o fato de flutuações do vácuo seguirem um padrão estatísico (determinado pelas leis do setor eletrofraco do modelo padrão + QCD!) com não haver causalidade nas mesmas!
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"Sobre o segundo ponto, não existem leis físicas na natureza, o que chamamos de lei física é uma descrição matemática de um fenômeno comum, tal como as leis de Newton, de Kepler, da Gravidade e da Termodinâmica. O fenômeno em si não está sob qualquer lei, assim como o objeto mesa não está sob a palavra mesa."
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me desculpe, mas não vou perder tempo discutindo semântica contigo, pois isso é absolutamente inútil e não altera em absolutamente nada os argumentos que expus. vamos pegar um exemplo simples, novamente para ilustrar o ponto: o potencial gravitacional netwoniano é do tipo 1/r. isso é uma lei da natureza, ou seja, a natureza segue uma padrão de repetição onde os fenômenos gravitacionais obedecem um potencial do tipo 1/r e não um potencial do tipo 1/r², 1/r³, cosh(r), ou qualquer outra expressão matemática. a expressão observada na natureza para o potencial gravitacional é 1/r. isso é parte do que se chama na física de "lei da gravitação universal newtoniana".
sua comparação com a mesa é totalmente inválida. o objeto chamado de mesa em português é chamado de table em inglês e de tisch em alemão. o vocábulo usado para designar o objeto é irrelevante, ele não muda devido a isso, tanto quanto o potencial gravitacional é 1/r independentemente se você chama isso de lei da natureza ou de "um fenômeno comum". o tal "um fenômeno comum" ao qual você se refere ocorre sempre da mesma forma (o potencial gravitacional não é 1/r agora e r² daqui a 3 segundos) e por isso nos referimos a este padrão de repetição (ou seja, repetidas experiências dão sempre 1/r para o potencial gravitacional) como sendo uma "lei da natureza".
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"Sobre a tal "caixa preta" que tu citou, esse é apenas um conceito filosófico, por definição não-provável nem falseável, portanto não científico. Qualquer coisa que se infira sobre a transcendência é um argumento arbitrário, pois se algo é transcendente, é incognoscível, tampouco se pode dizer que esse "algo" existe."
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novamente, vamos por partes:
a) é óbvio que a caixa preta não é falseável e, portanto, não é um conceito científico, mas sim estritamente lógico e filosófico. e não há absolutamente nenhum problema nisso. de fato, como coloquei, existem várias coisas que não tem como ser explicadas pelo método científico, dentre elas, a própria existência do universo. outros exemplos de ramos do intelecto humano não submetidos ao método científico são a lógica e a matemática, as quais independem completamente de qualquer tipo de empirismo, ao contrário de ciências da natureza e humanas;
b) não confunda não ser científico com não poder ser comprovado em algum sentido. um teorema matemático pode ser provado usando regras lógicas, ainda que não haja qualquer experiência envolvida;
c) os argumentos que pus não tem absolutamente nada de arbitrários, são argumentos lógicos e que demonstram a necessidade de uma causa externa/transcendente ao próprio universo físico;
d) a existência da caixa preta é inferida logicamente pelos argumentos que coloquei. o fato dela ser transcedente apenas indica que não podemos ter certeza sobre suas proriedades gerais (a não ser que ela própria as revele, como acreditam os religiosos; neste caso, é claro, tal possível revelação só pode ser aceita por fé).
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"Por fim, a lógica é apenas uma coleção de modelos, conceitos e postulados. Ela por si não pode provar a existência de qualquer coisa na realidade, sendo necessário pra isso o empirismo, onde a lógica é um modelo adequado a ele. Não existe "necessidade lógica" da existência de qualquer coisa, isso é apenas um fantasma filosófico."
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seu argumento é absolutamente falho. eu posso demonstrar o teorema de pitágoras para qualquer colegial e não há qualquer necessidade de empirismo para que tal demonstração seja válidade. de fato, como te disse antes, a matemática não está submetida á empiria (ao contrário de ciências da natureza e ciências humanas).
o mais engraçado do seu raciocínio é a contradição óbvia no mesmo: você afirma que a empiria é que legitima em todos os casos a existência de algo na realidade, mas aí eu te pergunto, como é que você prova esta afirmação?
eu vou deixar você se divertir tentando provar a afirmação acima...volto a noite/de madrugada para ver como você está se saindo!
this is a time of reduced awareness.