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(Cabeça de estátua de Crasso)
Ciente de que, no que se refere aos louros obtidos nos campos de batalha, ele era inferior aos seus dois colegas, Crasso ansiava por uma conquista militar que lhe pusesse em pé de igualdade a Pompeu e César.
Sendo o homem mais rico de Roma, e conhecido por sua ganância, Crasso acreditava que seu caminho para a glória militar estava em atacar a Pártia, império que disputava com Roma a influência sobre o Oriente Médio e, principalmente, sobre o Reino da Armênia.
Note-se que a presença romana na Síria era um foco de tensão entre ambos os impérios e isso continuaria assim até o século VII D.C, quando o Imperador romano-bizantino Heráclio esmagou a Pérsia Sassânida, sucessora da Pártia, apenas alguns anos antes de toda a região ser varrida pela expansão dos árabes muçulmanos.

A BATALHA DE CARRAS
Crasso, então, decidiu invadir a Pártia, cruzando a fronteira com a Mesopotâmia, comandando 7 legiões em um total de 43 mil homens, sendo 35 mil legionários, 4 mil tropas leves e 4 mil cavaleiros.
Ao longo da História, as rotas de expedições militares contra a Mesopotâmia partiam da Armênia, montanhosa e menos árida e, mesmo quando eram originárias da Síria, costumavam seguir o curso do rio Tigre ou do Eufrates, porém Crasso, ignorando os conselhos do rei armênio Artavasdes, aliado de Roma, decidiu cruzar o deserto visando um ataque direto às principais cidades partas.

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O rei Orodes II, da Pártia, decidiu enviar uma expedição punitiva contra os Armênios, e outro contingente, menor, com o objetivo de atrasar o avanço romano, contendo dez mil cavaleiros, sendo 9 mil deles arqueiros montados e mil cavaleiros couraçados, chamados de catafractos, comandados pelo general Surena.
Um chefe aliado de Roma, do reino de Osroene, chamado Ariamnes, provavelmente de origem aramaica ou árabe, instigou Crasso a avançar contra o contingente comandado por Surena, guiando-o para uma região árida e desolada do deserto. O que Crasso não sabia é que Ariamnes havia sido subornado pelos Partas.
Então, quando os romanos estavam já no deserto, próximo à cidade de Carras, os Partas cercaram os romanos.
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(Estátua do general Surena, no Museu Mevlana, em Konya, na Turquia)
Embora em menor número no quantitativo total de tropas, os Partas se aproveitaram do fato de que a cavalaria romana era pouco numerosa e, valendo-se disso, eles conseguiam aproximar-se para atacar os romanos despejando torrentes de flechas, mas sem precisar entrar em combate direto com os legionários, que eram sabidamente superiores neste quesito.
Os romanos tentaram se proteger das flechas inimigas com os escudos, entrando na formação conhecida como “quadrado”. Porém, o calor do deserto e o aumento das baixas começaram a enfraquecer o moral dos legionários.
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No início, a tática dos romanos era esperar até que os arqueiros inimigos ficassem sem flechas, mas Surena, habilmente, conseguiu remuniciá-los usando camelos.
Incomodados com as incessantes descargas de flechas, os legionários, então, recorreram à mais defensiva de todas as formações, a tartaruga (testudo), que, no entanto, praticamente impedia qualquer contra-ataque romano.

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Crasso ordenou que um destacamento de 1300 cavaleiros gauleses, secundados por 500 arqueiros e oito coortes de infantaria (cerca de 4 mil soldados), comandados por seu próprio filho, Públio Cornélio Crasso, saíssem da formação e atacassem os cavaleiros partas, que fingiram uma retirada, visando afastar o destacamento do grosso das tropas romanas.
Enquanto as tropas comandadas por Públio avançavam, Surena ordenou que o seu contingente de arqueiros montados desse a volta e se colocasse na retaguarda do inimigo, enquanto que os catafractos atacavam a cavalaria gaulesa.
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(Relevo de um arqueiro montado parta, (foto By Jean Chardin – Palazzo Madama, CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1766352)
Os gauleses lutaram bravamente, mas, sem armadura e com armamento leve, não eram páreo para os pesados cavaleiros partas. Finalmente, todo o contingente, acossados pelas flechas, foi obrigado a se refugiar em uma colina, onde Públio, sem alternativas à rendição, resolveu cometer suicídio. Sobraram apenas 500 combatentes vivos de sua tropa, que foram capturados.
Enquanto isso, Crasso havia ordenado que o restante das tropas avançasse contra os Partas. No entanto, ao se aproximar dos inimigos, ele foi confrontado com a cabeça de seu filho espetado na lança de um catafracto.
Os ataques dos arqueiros partas, agora sem qualquer temor de contraataque por parte da cavalaria romana, recrudesceram e continuaram até a caída da noite, até o ponto em que Crasso, muito abalado pelo destino do filho, ordenou uma retirada total para a cidade de Carras.
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(Representação da Batalha de Carras, por piojote (Ferdinand Von Nielsen)
Os romanos deixaram no campo de batalha cerca de 4 mil soldados feridos, que foram prontamente mortos pelos Partas. Para piorar, durante a retirada para Carras, 4 coortes (cerca de 2 mil soldados)perderam-se na escuridão do deserto, sendo cercadas e liquidadas pelos inimigos.
Surena, então, ofereceu aos romanos uma trégua, que foi, inicialmente recusada. Porém, os já desesperados soldados romanos ameaçaram fazer um motim e, assim, Crasso foi obrigado a negociar.
Quando Crasso e sua escolta foram ao encontro dos Partas para tratar dos termos do armistício, ocorreu um entrevero, após um soldado parta puxar as rédeas do cavalo do comandante romano e Crasso foi capturado.
Consta que os Partas, sabedores do já notório apreço de Crasso por dinheiro, teriam derramado ouro derretido pela sua garganta, matando-o dessa forma.
O exército romano, agora sem seu comandante, tentou romper o cerco, mas acabou sendo derrotado.
Apenas 10 mil soldados romanos conseguiram escapar e chegar à Síria, sendo, do exército original, 20 mil morreram e 10 mil foram capturados pelos Partas. As águias-estandartes das legiões também foram levadas pelos Partas como despojos, um fato considerado humilhante pelos romanos. Elas somente seriam devolvidas quase 30 anos mais tarde, graças a um grande esforço diplomático do imperador Augusto.
CONSEQUÊNCIAS DA BATALHA
Os Partas, fortalecidos foram bem sucedidos na invasão da Armênia, que passou, momentaneamente a ser sua aliada, complicando a situação estratégica de Roma no Oriente. Porém, ao tentar atacar a Síria, eles foram repelidos pelos sobreviventes da Batalha de Carras, comandados por Caio Cássio Longino (que depois seria um dos assassinos de Júlio César).
Muitos estudiosos entendem que a morte de Crasso, que resultou na dissolução do Primeiro Triunvirato, precipitou as tensões que resultaram na Guerra Civil entre os partidários da facção senatorial dos nobres (Optimates), liderados por Pompeu e a facção dos Populares, cujo líder era Júlio César.

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(A famosa estátua de Prima Porta, do imperador Augusto, em cuja couraça estão relevos retratando a devolução dos estandartes romanos capturados em Carras)
QUAL O DESTINO DOS SOLDADOS ROMANOS CATIVOS?
O rei Orodes II da Pártia, enviou os prisioneiros romanos capturados em Carras para o leste do seu território, usando-os como mão de obra para construções, pois os legionários romanos eram hábeis construtores.
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(Moeda cunhada pelo rei Orodes II, By Classical Numismatic Group, Inc. http://www.cngcoins.com, CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.p ... d=28299974)
Em 1941, o professor universitário de sinologia norte-americano Homer Dubs, da Universidade de Oxford, e profundo conhecedor da história da China, notou que muitos habitantes da região onde ficava a antiga cidade de Liqian, na província chinesa de Gansu, tinham olhos claros e traços caucasianos. Homer Dubs relacionou esse fato com um antigo relato histórico chinês da Batalha de Zhizhi, ocorrida em 36 A.C., quando o exército Han atacou uma fortaleza controlada pelo chefe da tribo Xiongnu (ou Hsiung-nu), oriunda das estepes asiática, próxima a Taraz, no atual Casaquistão.
Segundo os relatos, no ataque, os Han teriam lutado contra um grupo de soldados que lutavam em uma formação de “escamas de peixe”, que relembraria a “tartaruga” dos romanos. Assim, Dubs teorizou que os soldados da formação “escama de peixe” seriam os legionários romanos de Crasso, que foram feitos prisioneiros em 53 B.C., e que, depois de serem levados para a fronteira oriental da Pártia, teriam conseguido escapar e virado mercenários à serviço dos Xiongnu.
Finalmente, segundo Dubs, os legionários capturados na Batalha de Zhizhi teriam sido assentados pelos Han em Liqian, o que explicaria os traços caucasianos dos seus habitantes. Vale observar, contudo, que o lugar onde ocorreu a referida batalha fica quase à meio-caminho entre Carras e Liqian…

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O problema é que jamais se encontrou qualquer vestígio de artefato de origem ou de inspiração romana em Liqian. Testes de DNA também não encontraram marcadores específicos da Itália (origem da maior parte das legiões de Crasso).
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(A prefeitura da Liqian não perdeu tempo e construiu esse monumento à “herança romana” da cidade. Note-se o legionário romano à direita).
Embora metade da população atual da antiga Liqian tenha DNA caucasiano, isso se coaduna com o fato do local encontrar-se na Rota da Seda, milenar via de contato entre a China e a Ásia Central. Acrescente-se que, durante muito tempo, desde 2 mil A.C e até antes disso, houve um influxo de povos indo-arianos para a China, como, por exemplo, os Tocarianos, que são caucasianos. Vale observar, por sinal, que as múmias de Tarim, encontradas em território chinês e datadas de 2000 A.C, são de pessoas de cabelos louros e traços ocidentais (vide foto de algumas das múmias abaixo)
