Rio libera em massa menores infratores
Enviado: 19 Abr 2015 14:30
Criadas para recuperar e reintegrar à sociedade os menores de idade que cometeram infrações, as chamadas instituições socioeducativas, em sua maioria, não cumprem seu papel, são palco de constantes rebeliões e vivem superlotadas. Como mudar essa situação? Há quem defenda uma reforma radical, aperfeiçoando estruturas e credenciando os melhores profissionais. O projeto de redução da maioridade penal, em tramitação no Congresso, vai ainda mais longe: prevê transferir parte dos infratores para o sistema penitenciário. No Rio de Janeiro, o desembargador Siro Darlan, chefe da coordenadoria das Varas da Infância e Juventude no Tribunal de Justiça do Estado, teve outra ideia: resolveu rever todos os processos, o que, na prática, está liberando os internos do Rio. O Ministério Público Estadual confirmou 56 revisões em abril e está examinando outras 170 do fim de março, das quais nem sequer tinha conhecimento. Segundo o MP, o resultado da varredura tem sido a "liberação indiscriminada de adolescentes autores de atos infracionais gravíssimos, análogos a crimes considerados hediondos". Até o fim de junho, todos os processos serão reexaminados.
A decisão de Darlan foi tomada durante uma visita ao Educandário Santo Expedito, seis dias depois de uma rebelião em que quatro religiosos foram feitos reféns. Na ocasião, 310 internos superlotavam a unidade com capacidade para 220 infratores, dentro do complexo penitenciário de Bangu. Darlan designou a juíza Cristiana Faria de Cordeiro para a função, e os trabalhos começaram imediatamente. Em duas sessões realizadas por ela e contabilizadas no MP, em 6 e 13 de abril, dos 56 adolescentes que tiveram as penas reexaminadas, só dois não foram beneficiados; os outros 54 saíram por extinção da pena ou estão em liberdade sob alguma condição. "O que estamos presenciando nessas audiências é um verdadeiro escândalo. Inúmeras irregularidades estão sendo cometidas com o único escopo de esvaziar essas unidades superlotadas", enfatizam os promotores em nota a VEJA.
Para o MP, a caneta da juíza passa por cima de pareceres internos recentes que recomendam a permanência dos infratores nas instituições. Um dos argumentos mais usados é que eles completaram 18 anos - ainda que uma instância anterior já tivesse levado esse fato em conta e, mesmo assim, decidido que não era hora de eles saírem. Encaixam-se aí histórias como a de José Manoel da Silva Filho, o China, precoce líder do tráfico em uma favela de Niterói, apreendido pelo assassinato de um cliente que comprou e não pagou, e a de Lucas Gonçalves Norte, que, em 2014, aos 17 anos, e já com longa folha corrida de assaltos na Baixada Fluminense, esfaqueou até a morte a namorada grávida, Derliane Corrêa da Silva, de 13. Na semana passada, ambos tiveram a pena extinta e deixaram o Educandário Santo Expedito pela porta da frente. "Nenhuma decisão contrariou pareceres técnicos. A visão do MP é equivocada e desumana. O que deve ser avaliado não é mais o ato infracional praticado, e sim o aproveitamento do infrator ali dentro", justifica a juíza Cristiana. "Há um descaso, um abandono dos meninos. As reavaliações foram feitas com critério", defende Darlan.
Existem atualmente 1 200 menores ocupando 800 vagas em dez instituições fluminenses. No Rio, o pior cenário é na unidade de triagem, próxima ao aeroporto internacional, em que 400 internos se espremem onde cabem 210. A curva de internos não para de crescer: o primeiro trimestre de 2015 registra aumento de 30% sobre o mesmo período do ano passado. Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o menor internado tem direito a uma reavaliação a cada seis meses. Um juiz e um promotor, com base em pareceres de um assistente social, um psicólogo e um pedagogo, decidem se a internação persiste ou não, podendo estendê-la até os 21 anos. No Rio, as decisões da juíza começaram a afetar inclusive esse processo. "Nós nos sentimos acuados. Quem trabalha no sistema está com medo de segurar os garotos e sofrer represálias, dentro e fora da instituição", admite um funcionário do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase). A nota do Ministério Público classifica as audiências da juíza Cristiana como "um verdadeiro descalabro", com "inúmeras ilegalidades". Uma delas é a rapidez com que os menores ganham a liberdade, "não havendo tempo hábil de sustar os efeitos da decisão através de recursos". Compreensivelmente, a notícia se espalhou: internos do estado inteiro estão pedindo transferência para o Rio. Sabem que, se conseguirem, em julho poderão estar de volta às ruas.
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A decisão de Darlan foi tomada durante uma visita ao Educandário Santo Expedito, seis dias depois de uma rebelião em que quatro religiosos foram feitos reféns. Na ocasião, 310 internos superlotavam a unidade com capacidade para 220 infratores, dentro do complexo penitenciário de Bangu. Darlan designou a juíza Cristiana Faria de Cordeiro para a função, e os trabalhos começaram imediatamente. Em duas sessões realizadas por ela e contabilizadas no MP, em 6 e 13 de abril, dos 56 adolescentes que tiveram as penas reexaminadas, só dois não foram beneficiados; os outros 54 saíram por extinção da pena ou estão em liberdade sob alguma condição. "O que estamos presenciando nessas audiências é um verdadeiro escândalo. Inúmeras irregularidades estão sendo cometidas com o único escopo de esvaziar essas unidades superlotadas", enfatizam os promotores em nota a VEJA.
Para o MP, a caneta da juíza passa por cima de pareceres internos recentes que recomendam a permanência dos infratores nas instituições. Um dos argumentos mais usados é que eles completaram 18 anos - ainda que uma instância anterior já tivesse levado esse fato em conta e, mesmo assim, decidido que não era hora de eles saírem. Encaixam-se aí histórias como a de José Manoel da Silva Filho, o China, precoce líder do tráfico em uma favela de Niterói, apreendido pelo assassinato de um cliente que comprou e não pagou, e a de Lucas Gonçalves Norte, que, em 2014, aos 17 anos, e já com longa folha corrida de assaltos na Baixada Fluminense, esfaqueou até a morte a namorada grávida, Derliane Corrêa da Silva, de 13. Na semana passada, ambos tiveram a pena extinta e deixaram o Educandário Santo Expedito pela porta da frente. "Nenhuma decisão contrariou pareceres técnicos. A visão do MP é equivocada e desumana. O que deve ser avaliado não é mais o ato infracional praticado, e sim o aproveitamento do infrator ali dentro", justifica a juíza Cristiana. "Há um descaso, um abandono dos meninos. As reavaliações foram feitas com critério", defende Darlan.
Existem atualmente 1 200 menores ocupando 800 vagas em dez instituições fluminenses. No Rio, o pior cenário é na unidade de triagem, próxima ao aeroporto internacional, em que 400 internos se espremem onde cabem 210. A curva de internos não para de crescer: o primeiro trimestre de 2015 registra aumento de 30% sobre o mesmo período do ano passado. Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o menor internado tem direito a uma reavaliação a cada seis meses. Um juiz e um promotor, com base em pareceres de um assistente social, um psicólogo e um pedagogo, decidem se a internação persiste ou não, podendo estendê-la até os 21 anos. No Rio, as decisões da juíza começaram a afetar inclusive esse processo. "Nós nos sentimos acuados. Quem trabalha no sistema está com medo de segurar os garotos e sofrer represálias, dentro e fora da instituição", admite um funcionário do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase). A nota do Ministério Público classifica as audiências da juíza Cristiana como "um verdadeiro descalabro", com "inúmeras ilegalidades". Uma delas é a rapidez com que os menores ganham a liberdade, "não havendo tempo hábil de sustar os efeitos da decisão através de recursos". Compreensivelmente, a notícia se espalhou: internos do estado inteiro estão pedindo transferência para o Rio. Sabem que, se conseguirem, em julho poderão estar de volta às ruas.
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